terça-feira, 16 de junho de 2009

ARPEJOS SEM PERSPECTIVA

Joaquim Moncks

Minha fúria de mudar o mundo
tem por baixo um boneco desanimado.
Aos mais de sessenta,
sou um maiacovski sem forças.
Tentei o novo.
Surgiu-se-me o fantasma do Real.

Este mundo de bens de consumo
é a farsa do milênio terceiro.
Mais enricada do que nunca
a criatura humana empobreceu-se
de valores.
Bato à porta do futuro:
meus neurônios alertam
para o visto e o revisto.

Tinge-se de sangue a janela da esperança.
Mais que nunca
como apontou Charles Baudelaire
a trepada é o lirismo do povo.

A rigor, neste tempo de asperezas
pega-se o automóvel e se passa por cima
do mendigo da esquina.
O braço que estende a mão ao óbolo
duplica-se, triplica-se, multiplica-se.
A fome vai além do gesto.

– Do livro BULA DE REMÉDIO, 2004/2009.
http://recantodasletras.uol.com.br/poesias/1648362

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