domingo, 20 de setembro de 2009

CARRETAS

Joaquim Moncks

Carretas, rondas do tempo

maniáticas de sóis e lunaréus.

Carregam estafas e andanças
e em mim a outrora criança:
ressoam cirandas e danças
e o gemido de liberdade
ecoa nas veredas da serra.

Nave do nauta telúrico,
rancho sobre duas luas,
gêmea de pampas, estrelas e léus,
roçando várzeas, lançantes,
traçando esta cíclica gesta
de esperanças, trabalho e terra.

Nas lonjuras dos caminhos,
sofrendo encruzilhadas e escarcéus,
arremataste ao gaúcho
verdades abertas no céu.

– Do livro DE QUANDO O CORAÇÃO ABRE A CORDEONA, 1978/2009.
http://recantodasletras.uol.com.br/poesias/35924

CARRETA DE INOCÊNCIAS


Joaquim Moncks

O canto de meus amores
é uma carreta perdida.
Cada eixo de ilusões
cochicha a canção ao vento.

Geme a garganta dos sonhos
e é um sussurro de estrelas
gemendo na boca do Cristo
– sua coroa de espinhos.

Toda a vez, meus irmãos,
em que a carreta dos ventos
chora o cio dos amores,
delato a santa inocência.

Há um sorriso futuro
que se perdeu num lançante
e num lampejo insolente,
frustrou-se a coruja do brete.

Ainda hoje os amores
são perdidos espíritos.
S’esconde no final do mate
a seiva da liberdade.

Esta canção resistente
é a que me faz sentir vivo.
É o olho do tempo rodando
n’alguma esquecida quimera.

Sempre que olho o horizonte
range o rancho sobre duas luas
e na picanha do boi Suspiro
sangra o aguilhão da saudade.

– Do livro DE QUANDO O CORAÇÃO ABRE A CORDEONA, 1978/2009.
http://recantodasletras.uol.com.br/poesias/847638

LAMPEJOS DE PRIMAVERA

Joaquim Moncks

Aqui, na foz do Rio Mampituba, novo dia bonito, sem vento, com o mar sonolento. A aldeia ressona recolhida aos lençóis.

De quando em vez, a massa líquida se espreguiça e se retorce feito uma imensa lagartixa. Lânguida e esquiva.

A refração do sol cria um lençol de brilhos. Ainda ressonariam ali dorminhocas estrelas?

Algumas tainhas rebrilham o lombo à luz multicor. Parecem borboletas sobre um lençol tinto de liquens.

As retinas, extasiadas, bebem o espetáculo.

– Do livro O HÁLITO DAS PALAVRAS, 2008/2009.
http://recantodasletras.uol.com.br/prosapoetica/1773478