terça-feira, 8 de novembro de 2011

PÁTRIA: VARIAÇÕES SOBRE O TEMA

Joaquim Moncks

Desvirgino o verso como quem sabe dos segredos. Pátria é essa amada alma
em que mora a inocência. A pretensa liberdade se autodesenha: alegre dama da noite, nos cubículos, nas favelas. É o fanal doido, que mesmo triste, inscreve arabescos por onde passa. Motivos somos nós, cristais espargindo sombras: esmeraldas foscas, auriverdes do nada. O aquário em que se aprende a nadar... Pátria ainda é a trincheira dos encontros. Cantemos!

– Do livro SORTILÉGIOS, 2011.
http://www.recantodasletras.com.br/prosapoetica/3291841
CONVITE À REORDENAÇÃO DO CAOS

Joaquim Moncks

O que é esse fruto transfigurado da matéria da vida a que chamamos Poesia? O que é essa voz que nada tem de diletante, e sim, é o pedido mais fundo de socorro? A Poesia desacomoda os acomodados de plantão, esses tristes súditos das bênçãos de Deus. O Bem e o Mal estarão juntos, como sempre, mas a vida jamais será a mesma. Vem, junta-te a nós! E engole uma nesga desse sol...

– Do livro SORTILÉGIOS, 2011.
http://www.recantodasletras.com.br/tutoriais/3291202
A CANÇÃO DOS DIAS

Joaquim Moncks

Na permanente canção do tempo nem o temor das perdas amedronta. Sou daqueles da insólita rota: os que ainda fiam-se na esquina próxima, mesmo que cansados de expulsar demônios em seus rotos vestidos angelicais... O que sei de mim se estou de olhos roxos, fumaça criando vultos de ausências? Fogem do cais maduro oxigênios do rio escuro, apenas peixes luminosos. Empolgado de luas, chora o violão: passaporte pra desenhar iluminuras. Dentro de nós, o espírito cochicha a canção das estradas, olhos fitos no conto-esperança. O que teremos visto – em verdade – após o dia seguinte?

– Do livro SORTILÉGIOS, 2011.
http://www.recantodasletras.com.br/prosapoetica/3292781
CARTA ABERTA SOBRE LIVROS

Joaquim Moncks

Neida Rocha, ativista cultural e estimada amiga!

Em primeiro lugar, peço vênia para estender estas palavras de agradecimento e louvação ao escritor/editor Milton Pantaleão, da Editora Alternativa, de Porto Alegre.

Muito grato por tua manifestação em relação a mim e ao Jorge Braga, que atuaremos no projeto “CONVERSA SOBRE LIVROS”. Ambos estamos muito felizes por virmos ser recebidos na "Bibliotheca Pública de Pelotas” – instituição tradicionalíssima na cidade – justo para falar sobre o que gostamos: LIVROS e suas trajetórias. Creio que não decepcionaremos o público eventualmente presente, mormente aos jovens, que – creio – esperam de nós um depoimento detalhado de como vemos o nosso ofício de escriba e o produto decorrente de nossos esforços, dispêndio de dinheiro e zelo para com a memória de um povo que pouco se achega aos livros, em geral.

Ressalte-se que a Biblioteca de Pelotas é uma associação de direito privado desde a sua fundação, em 1875.

Escrever, no Brasil, é um ato de amor cívico. Pouco se ganha, com as vendas – em regra – para totalizar o pagamento da edição. E o mecenato público e privado é precaríssimo, ainda mais para escritores novatos. O seu autor acaba fazendo BENEMERÊNCIA para livrarias, meios de comunicação social, instituições culturais e um sem número de cortesias para os afetos... Todavia, o autor ganha milhares de admiradores, em que alguns se tornam AMIGOS em razão do gesto benemerente, carinhoso, nem sempre pelo teor e conteúdo da obra...

Estamos em efetivo enfrentamento para que o dado precário de 3,8 livros/habitante/ano, no Brasil como um todo, seja superado. Mercê do auspicioso registro de que o povo gaúcho lê mais do que a média nacional: 5,6 livros/habitante/ano, conforme estatísticas de 2006. Segundo informações extra-oficiais e não confirmado o método estatístico, já teríamos superado o índice de 6,5 livros/habitante/ano, no RS, em 2011.

Tudo isso graças aos esforços de associações privadas fomentadoras da leitura. Os órgãos públicos pouco fazem, no geral, exceção feita ao Ministério da Cultura, que detém o grosso das verbas públicas específicas, dando primazia a projetos culturais de publicação provindos de órgãos públicos e privados que gozam de influência na Comissão Nacional de Incentivo à Cultura – CNIC. Os proponentes avulsos que se lixem: o Ministério aprova o projeto referente ao pedido de verba para a publicação, porém a carta de crédito terá de ser “vendida” ao empresário no jogo do mecenato. O autor acaba perdendo o prazo de captação e se esvai a possibilidade...

Quanto à Coletânea “JOAQUIM MONCKS & AMIGOS”, é preciso que o homenageado deponha para a história: o livro é uma das melhores obras cooperativadas lançadas no RS, nos últimos 40 anos, homenageando um único autor – em que cada figurante indeniza a sua participação, antecipadamente à editoração – com alto ônus pessoal, portanto. Baseio-me na preciosa apresentação estética, qualidade gráfica e esmerada confecção editorial. Também pelo expressivo número de autores que a compõem, que totalizam 155 (cento e cinquenta e cinco) condenados ao pensar, em prosa e verso.

Quanto à qualidade de texto, bem, este deixemos à consideração do receptor. Cada leitor terá, por certo, sua opinião sobre a obra coletiva. Porém, nela, há um belo registro das atuais concepções formais e estéticas quanto ao verso e à prosa curta. Um documento importante para a história da literatura rio-grandense e nacional.

– Do livro SORTILÉGIOS, 2011.
http://www.recantodasletras.com.br/cartas/3293466
A PALAVRA COMO PROPOSTA

Joaquim Moncks

Recebo o escrito abaixo, com a bonomia da autora e o pedido de análise. Vamos lá. Comecemos pela escansão dos versos:

“O IPÊ ROSA

A/bre/-se o/ di/a/, ma/dru/ga/da/fria / 10
Da/ mi/nha/ já/ne/la a/d/mi/ro a es/tu/pen... da / 10
O/bra/ que a/ na/tu/re/za o/fe/re/cia: / 10
A/ flo/ra/da/ do i/pê/ co/mo u/ma pren... da. / 10

Bu/quês/ ro/sa/dos/ ex/plo/din/do eu/ via / 10
Bri/lhan/do,/ que or/na/vam/ a ar/vo/re/ de/ ren... da. / 10
Tão/ be/los/ que o/ pre/to/ ga/lho es/con/dia. / 10
São/ tan/tas/ flo/res/ vi/bran/do em/ o/fe/ren... da! / 11

Nos/ o/lhos/ bri/lha a/ luz/ en/can/ta/do...ra! / 10
Pá/ssa/ros/ fe/li/zes/ em/ re/vo/a... das... / 10
Na/ do/ce/ bri/sa/ das/ ma/nhãs/ a/fo... ra... /10

Mi/nha/ be/la ár/vo/re, ho/je es/ta/ ro/sa... da... / 10
Com/ flo/res,/ que a/ma/nhã/ se/rão/ pi/sa... das /10
Pra’/ quem/ tal/vez,/ nem/ te/ viu,/ na/ cal/ça... da. / 10

Elisa Alderani, via e-mail, em 24/10/2011.”.

Poetamiga! Trata-se de um bom exemplar em forma fixa, porém nada em especial ou originalidade a olhos vistos. Um SONETO bem exposto, o formato tradicional dos quatorze versos, desde a sua fixação, aos tempos de Petrarca. Vão lá mais de setecentos anos. Ainda sem o estrambote acrescido por Shakespeare e outros, que tornou diferenciado o modelo e foi escassamente usado. Pela escansão (anotações acima), constata-se uma imperfeição de silabação fônica no quarto verso do segundo terceto. É o que chamamos “verso do pé quebrado”... O conteúdo é escorreito para a proposta sugerida no título da peça. Conta a historieta de uma árvore plena de beleza ao tempo da floração. Trata-se, em verdade, de uma croniqueta (crônica breve) escrita em versos, como era de costume na velha escola clássica, já de há muito sucedida pelo modernismo, expressão formal da contemporaneidade, conformado no POEMA. Este, nos dias atuais, é o fruto materializado e predominante na Poesia da contemporaneidade... Aqui, retomada a linguagem do início dos anos XX, no Brasil, e as experiências de formato e proposta lírica, pouco sobra para o receptor em termos de SUGESTIONALIDADE e TRANSCENDÊNCIA, que são características da boa poesia de todos os tempos, em qualquer forma, formato ou corrente. Veja-se que a autora optou pelo comparativo (no quarto verso do primeiro quarteto), em oposição ao comparativo abreviado a que chamamos METÁFORA, que é o mais usual tropo ou figura de linguagem. Sem estas, não há a falar em Poesia como gênero literário. São versos – sim – mas, ao rigor metodológico, ausente está a Poesia como expressão de beleza estética. No texto, apresentado em versos, há rarefeita Poesia como expressão lingüística em sentido CONOTATIVO. Note-se que toda a exposição verbal é em sentido DENOTATIVO, ausente o mergulho (verticalidade da Poesia) em profundidade do ser e proposta de reflexão. Resta aparente o feeling (o sentir do eu poético) do autor frente ao objeto de seu foco sensitivo. O que sobra é a construção versificada, sem pretensão de transfiguração da matéria da vida. Até porque a Poesia não se destina a agir diretamente no plano da realidade. A obra ora sub examine está prenhe de doçura, e isso a faz parecer Poesia... O sentir feminino – mais do que o masculino – tem esse condão: o possesso dulçurismo... Faço a presente avaliação crítica como peça autônoma – no gênero Poesia – em termos de teoria literária e experiência pessoal. Sei que este soneto foi premiado em concurso literário, o que por certo, lhe deu alce e preferência, tendo em vista o conjunto poético apresentado à comissão avaliadora de tal certame. Textos vários e avaliadores que não sei quem são e nem cogito os seus patamares de experimentação. Para sua especificidade e azo, a obra “O IPÊ ROSA” cumpriu finalidade como peça estética, tanto é que restou premiada em primeiro lugar.Congratulações à autora, e que o estro de sua lavra lhe possa premiar muitas outras vezes, em concurso ou não; eis que o maior prêmio – ao meu inferior modo de ver – é a confraternidade da linguagem universal que o poema contém como palavra e traduz como proposta. Parabéns! E que venham muitos poemas... Com o apreço do poetinha JM.

– Do livro SORTILÉGIOS, 2011.
http://www.recantodasletras.com.br/ensaios/3295597
O VICIADO

Joaquim Moncks

Mais do que a camisa-de-força do estar vivo, havia um elemento no ar: a agonia de perceber o coletivo com o indiciador em riste, numa das mãos, e o polegar pra baixo, na outra. Tal como na antiga arena dos gladiadores. No deserdado, plasmado por um conjunto de atos e fatos, o mergulho na desesperança do after day. E eis que surge a sirene policial uivando no dorso das ruas...

– Do livro SORTILÉGIOS, 2011.
http://www.recantodasletras.com.br/contos/3299483
A CRÍTICA SEGUNDO O AUTOR NOVATO

Joaquim Moncks

Recebo, com alegria, esta interessante mensagem de uma confreira do Recanto das Letras sobre temática que me parece relevante a merece uma reflexão mais funda. Resguardo o nome da interlocutora para evitar mal-entendidos.

“Caro escritor, já tive a oportunidade de ler alguns comentários seus em textos de outros recantistas, e lhe digo que a força de suas palavras, duras e incisivas, me retiram lágrimas. Bom, eu as enxuguei e queria dizer-lhe que, caso um dia você tenha um tempinho e paciência, me sentiria honrada em passar pelo fio de sua navalha. Melhor a dor a sangre frio que passar a vida recebendo pomada anestésica. Ninguém evolui apenas com tapinhas nas costas. Obrigada.”.

– via e-mail pelo site do Recanto, em 27/10/2011.

Causa-me alguma estranheza que alguém se emocione até as lágrimas com uma colocação de análise crítica, ou seja, do mesmo eito ou similar “sentir” de quem lê uma peça poética – em que há a participação da emocionalidade – e daí se pode, naturalmente, entender a origem da contingência capaz de causar a emoção. Porque uma das funções da POESIA é emocionar o receptor. A crítica literária é fruto de análise racional sobre uma proposta emocional – especialmente em textos de iniciantes ou novatos – porque estes ainda se encontram no período em que estão à busca dos elementos estéticos frutos da INTUIÇÃO para confeccionar o conjunto de versos que dará origem ao POEMA... São os NOVE ANOS que Horácio, na antiguidade, dizia que era “para guardar o poema na gaveta”, esperando a sua maturação, para, então, PUBLICÁ-LO... Nesse momento de descobertas das nuances no processo de criação e o seu entorno, o analisado nem consegue ver a análise crítica como ação intelectiva que lhe possa fazer crescer... Neste período inicial, para pessoas muito sensíveis, a Crítica pouco poderá ajudar, até porque o autor não se dará conta de que, mormente no gênero Poesia, não é o EGO quem escreve, e, sim o seu ALTER EGO... E essa linguagem detalhista e metodológica o iniciante ainda não percebeu nem a introjetou, porque simplesmente a desconhece. Fica, apenas, embasbacado com o tal processo de criação poética que lhe produz sensações muito agradáveis, de uma magia prazerosa. Tudo é novo quando se começa a descobrir o mistério das Palavras... Eventual dureza e incisividade nos juízos críticos não são exercitadas com base na Emoção. Em geral, no receptor do estudo crítico – o trabalho técnico sobre a sua peça poética ou prosaica – os juízos analíticos emitidos por quem cumpre o ofício de escritor são entendidos como uma afronta ou interferência no processo pessoal de criação e inventiva, e, usualmente, provocam certa desconfiança ou são pouco considerados. Todavia, daí até provocar o nascimento da “lágrima”, vai uma grande distância. Denota, denuncia e escancara que o criticado é apenas um diletante que escreve para alimentar o EGO e não para a celebração da CONFRATERNIDADE entre os de similar concepção do mundo e de condenação ao pensar. A crítica literária será útil para quem já passou por essa etapa primária do EGO e da necessária chamada de atenção para si como vetor de compulsão criacional ou, ainda, que se utiliza da criação literária como terapia psíquica individual ou grupal, no caso de associação ou grupos literários, objetivando comportamentos variados dos sujeitos envolvidos no processo da Arte X Realidade. Porém, nesse caso específico, o agente propulsor – que funciona como ANTÍTESE – impulsionando a criação e/ou a ação comportamental é o TERAPEUTA e não o OFICINEIRO DE POESIA, como é a minha função no processo. Ou seja, aquele que atua na estimulação da produção do texto em Poesia. A estética do Belo se dá pelo aprimoramento dos elementos que a fazer fluir. A provocação ou a instigação crítica não se confunde com o gesto negligente do “tapinha nas costas”, passivo e cúmplice. Isso é verdadeiro, como bem colocou a missivista... Todavia, este provocar não pode ser tão tétrico a ponto de “passar o autor no fio da navalha”... No processo de aprimoramento literário, a lisonja e a conivência não são métodos propícios ao aprimoramento dos canteiros dos jardins do Belo. Também não é menos verdade que “cautela e caldo de galinha não fazem mal a ninguém”, como fala a sabedoria popular. E essas advertências aplicam-se ao crítico e criticado. E os textos vão, também, amadurecendo para a recepção da ação analítica... Até mesmo quando ainda não tenham nove anos de concepção a fim de poderem voar para além da gaveta...

– Do livro PALAVRA & DIVERSIDADE, 2011.
http://www.recantodasletras.com.br/teorialiteraria/3302490